STJ VETA FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS POR EQUIDADE EM CAUSAS DE VALOR MUITO ALTO

A fixação de honorários por apreciação equitativa não é permitida quando os valores da condenação ou da causa ou o proveito econômico da demanda forem elevados. É obrigatória, nesses casos, a observância dos percentuais previstos nos parágrafos 2º e 3º do artigo 85 do Código de Processo Civil, a depender da presença da Fazenda Pública na lide.

 

Essa foi a conclusão alcançada pela Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, em julgamento encerrado na manhã desta quarta-feira (16/3). O colegiado afastou a possibilidade do uso da equidade para calcular honorários de sucumbência nos casos em que o valor da causa for considerado muito alto.

 

Foram julgados quatro recursos, sob o rito dos repetitivos. Prevaleceu a tese proposta pelo relator, ministro Og Fernandes, seguido por maioria de votos. O enunciado terá observância obrigatória pelas instâncias ordinárias.

 

O cerne da questão está na aplicação do parágrafo 8º do artigo 85 do CPC, que fala em apreciação equitativa de honorários para casos "em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou, ainda, quando o valor da causa for muito baixo".

 

Para a Fazenda Pública, a regra é aplicável também aos casos de valores altos, em respeito à razoabilidade e proporcionalidade, além do intuito de evitar o enriquecimento sem causa de advogados que, ao defender clientes alvo de execuções fiscais milionárias, recebam honorários de sucumbência estratosféricos por trabalhos de muita simplicidade.

 

O que concluiu a Corte Especial, no entanto, é que a literalidade do parágrafo 8º não permite sua interpretação extensiva.

 

Tese e placar


A tese proposta pelo ministro Og Fernandes foi dividida em duas partes.

 

  • A fixação de honorários por apreciação equitativa não é permitida quando os valores da condenação, da causa ou o proveito econômico da demanda forem elevados. É obrigatória, nesses casos, a observância de percentuais previstos nos parágrafos 2º e 3º do artigo 85 do CPC, a depender da presença da Fazenda Pública na lide, os quais serão subsequentemente calculados a partir do valor a) da condenação; b) do proveito econômico obtido; c) do valor atualizado da causa.

  • Apenas se admite o arbitramento de honorários por equidade quando, havendo ou não condenação: a) o proveito econômico obtido pelo vencedor for inestimável ou irrisório; b) o valor da causa for muito baixo.

 

Votaram pela fixação dessa tese, além do relator, os ministros João Otávio de Noronha, Jorge Mussi, Mauro Campbell, Luís Felipe Salomão, Benedito Gonçalves, Raul Araújo e Laurita Vaz.

 

Abriu a divergência em voto-vista lido nesta quarta-feira a ministra Nancy Andrighi, que defendeu a possibilidade excepcionalíssima de fixar honorários por equidade nas causas de grande valor em que o arbitramento não refletir o efetivo serviço prestado pelo advogado.

 

A divergência foi acompanhada pelas ministras Maria Isabel Gallotti e Maria Thereza de Assis Moura e pelo ministro Herman Benjamin.

 

Vitória da advocacia


O resultado pode ser considerado uma grande vitória da advocacia, que  se organizou na defesa da aplicação literal do artigo 85 do CPC. Levou aos autos diversos pareceres de juristas, tributaristas e especialistas em Direito Econômico e Direito Civil. 

 

A OAB também levou a discussão  ao Supremo Tribunal Federal, na Ação Declaratória de Constitucionalidade 71, em que pede que o Judiciário seja proibido de aplicar o artigo 85 do Código de Processo Civil fora das hipóteses literalmente estabelecidas. O processo não tem decisão liminar e foi redistribuído ao ministro Nunes Marques.

 

Na prática, a posição permite que advogados sejam remunerados com base no valor da causa mesmo quando o trabalho for considerado simples. Um dos casos julgados exemplifica bem a aplicação da regra.

 

O REsp 1.906.618 trata de uma execução fiscal ajuizada por um município contra uma empresa em dezembro de 2018, cobrando tributos no valor de R$ 5,7 milhões. A parte ajuizou exceção de pré-executividade alegando que a exigibilidade do tributo estava suspensa por decisão em mandado de segurança, concedido 19 dias antes.

 

A sentença de duas páginas, em dezembro de 2019, extinguiu a execução fiscal sem resolução do mérito pela falta de interesse processual da Fazenda municipal diante da liminar que tornou inexigível o tributo municipal.

 

Por esse trabalho, os advogados da causa agora receberão, em valores atualizados, pouco mais de R$ 450 mil. Em grau de apelação, o Tribunal de Justiça de São Paulo havia aplicado a equidade para fixar valor de R$ 15 mil.

 

A regra é clara


Isso é possível e aceitável porque, segundo o ministro Og Fernandes, quando o parágrafo 8º do CPC menciona causas de valor inestimável para admitir fixação de honorários por equidade, está claramente tratando de hipóteses em que não é possível atribuir valor econômico, como ocorre em processos ambientais ou de família.

 

Apontou que, se no CPC de 1973 a jurisprudência do STJ admitia amplamente o uso da equidade para fixar honorários, na versão aprovada em 2015 o legislador quis suprimir essa possibilidade.

 

Para o relator, o argumento de que a simplicidade da demanda ou o pouco trabalho exigido dos advogados levaria ao seu enriquecimento sem causa não pode permitir o uso da equidade, mas serve para balancear a fixação do percentual dentro dos limites do parágrafo 2º do artigo 85.

 

"Temos regra. No famoso bordão esportivo, a regra é clara, a meu ver. Essa proporcionalidade está estabelecida pelo Código, goste-se ou não", disse.

 

Litigou, agora aguenta


A maioria se formou também em razão de um dos pontos mais destacados nas sustentações orais do repetitivo: o efeito estrutural dos honorários de sucumbência. Sem eles, as partes não têm risco ao ajuizar processos, o que leva a aventuras jurídicas e ações temerárias.

 

A Fazenda Pública, a maior litigante do Judiciário brasileiro, por meio das execuções fiscais, sem dúvida o maior gargalo enfrentado nos juízos, é um exemplo perfeito, segundo o relator.

 

"É muito comum ver, no STJ, a alegação de honorários excessivos em execuções fiscais de altíssimo valor posteriormente extintas. Tais execuções muitas vezes são propostas sem o devido escrutínio, sendo extintas por motivos previsíveis como problemas no polo passivo, o cancelamento da certidão da dívida ativa ou por estar o crédito prescrito", pontuou.

 

Segundo o ministro Og, cabe ao autor de cada demanda — seja o Estado, empresas ou cidadãos — ponderar bem a probabilidade de ganhos e prejuízos antes de ajuizar a demanda, sabendo que terá de arcar com honorários de acordo com proveito econômico ou valor da causa, caso vencido.

 

Remuneração adequada?


Abriu a divergência a ministra Nancy Andrighi, que propôs tese segundo a qual é admissível, excepcionalmente, o arbitramento dos honorários advocatícios sucumbenciais por equidade também quando se verificar, em decisão fundamentada, a evidente incompatibilidade entre os padrões remuneratórios instituídos pelo artigo 85, parágrafos 2º e 3º do CPC, e o trabalho efetivamente desenvolvido pelo advogado do vencedor.

 

Em extenso voto, ela defendeu que o caso é de aplicação da teoria da derrotabilidade das normas, segundo a qual cabe ao julgador adotar interpretação distinta daquela que seria obtida a partir da interpretação literal, em casos de situação aparentemente não considerada pelo legislador.

 

Para a ministra, se a disciplina dos honorários de sucumbência do CPC de 2015 tem por finalidade remunerar adequadamente o advogado em virtude do trabalho por ele desempenhado, então essa regra será incompatível com a finalidade quando sua aplicação literal conduzir a uma remuneração inadequada.

 

"Diferentemente do que normalmente se propõe, remuneração inadequada não é sinônimo apenas de aviltamento dos honorários do advogado, remunerando-o em patamar abaixo daquele correspondente ao trabalho por ele desenvolvido, mas também sinônimo de exorbitância, remunerando-o em patamar acima daquele correspondente ao trabalho por ele desenvolvido", pontuou.

 

Punição só para um lado


Segundo a divergência, impedir totalmente a fixação equitativa fora da hipótese prevista no parágrafo 8º do artigo 85 do CPC causaria desigualdade, pois vincularia os ganhos do advogado a questões externas ao serviço jurídico prestado. Por exemplo: a sorte de patrocinar uma causa simples, mas de valor nominalmente muito elevado.

 

Além disso, em vez de promover a litigância responsável, pode dificultar o acesso à Justiça. Mesmo aqueles que acreditam ter razão nas demandas judiciais poderão se ver impedidos de recorrer ao Judiciário devido ao risco de derrota — especialmente em um país problemático em que a Justiça é, em muitos casos, a última esperança.

 

Se o objetivo é promover a litigância responsável, a ministra Nancy Andrighi apontou que o ordenamento jurídico tem outros instrumentos para isso: multas e sanções previstas no próprio CPC. Pode-se, também, majorar custas processuais ou reduzir isenções e gratuidades — tudo a partir de devidos estudos e atuação do legislador.

 

"Não é adequado desnaturar os honorários advocatícios, atribuindo-lhes eficácia sancionadora sem que haja a readequação de seu destino", ressaltou. "Se verba honorária é técnica sancionatória a frear litigância predatória, nada mais razoável e lógico que serem destinados a quem sofre com litigância predatória: portanto, as partes e o estado", acrescentou.

 

REsp 1.850.512
REsp 1.877.883
REsp 1.906.623
Resp 1.906.618

 

 

 

 

 

fonte:https://www.conjur.com.br/2022-mar-16/stj-veta-fixacao-honorarios-equidade-causas-alto-valor?utm_source=dlvr.it&utm_medium=twitter





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